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A Interpretação no futuro – 2033

John Milton
É o ano de 2033. Minha filha de 21 anos, Marcella, está voltando de Xangai, após uma estadia de um ano, durante a qual melhorou seu mandarim. Desde jovem começou a aprender o que é hoje a língua mais falada do mundo, e, quando tinha quatro anos, contratamos uma preceptora que falava mandarim, para que ela pudesse ser educada trilingualmente, em inglês, português e mandarim.
A economia chinesa já ultrapassou a economia dos EUA, e a mandarim torna-se cada vez mais necessária para muitos empregos em bancos, no comércio e na indústria. Na Universidade de São Paulo, o chinês é agora o terceiro curso mais popular, perdendo apenas para a Medicina e o Direito. Há muitos empregos bem remunerados para aqueles que sabem chinês no ensino, na tradução e na interpretação, e o Instituto Mandarim é agora muito maior do que a Cultura Inglesa.
A profissão de Interpretação mudou muito devido à evolução tecnológica, especialmente o Intapp, um dispositivo portátil, desenvolvido pelos irmãos Bruno e Henrique Fonseca Zancul. Usando uma técnica semelhante ao do Google Translate, traduz instantaneamente a palavra falada em texto, que aparece no tablete Intapp. No entanto, ainda não é totalmente perfeito – sotaques regionais, diferentes velocidades de voz, e gírias resultam em erros, e por isso, em muitas ocasiões, particularmente com a interpretação entre línguas que são muito diferentes como o português e o chinês, o texto terá de ser corrigido pelo “intérprete”, que, como os intérpretes de conferência tradicionais, transmite o texto oralmente através de fones de ouvido para o público.
Uma fração de segundo após o orador começa a falar, a versão escrita aparece na tela. Se tem sorte, a versão escrita dará uma boa versão do texto falado, e em algumas combinações de idiomas como espanhol-inglês, francês-inglês e português-inglês o Intapp é tão bom que os delegados da conferência raramente precisam de intérpretes humanos. E quem se preocupa se a terceira pessoa ocasional “s” falte, ou a preposição esteja errada. De fato, no ComEng – o inglês pidgin simplificado falado em muitas reuniões de negócios – os sufixos são geralmente eliminados, como é com a forma interrogativa de “do”, quase uma reversão para o inglês pre-elizabetano, antes de Shakespeare.
Mas o Intapp às vezes tem problemas com acentos locais. Em uma recente reunião em São Paulo os organizadores optaram por usar Intapps. Mas o Intapp não conseguiu lidar com o sotaque texano do representante do banco Wells Fargo, a cadência musical nortista do executivo do Banco de Belém, e o sotaque forte de Glasgow do CEO do Royal Bank of Scotland. O Intapp não podia fazer mais do que produzir palavras incoerentes, e o problema só foi resolvido mandando um helicóptero para buscar o intérprete veterano, Reynaldo Pagura.
A tecnologia resultou no desaparecimento da maioria dos intérpretes “tradicionais”, e aqueles que são suficientemente espertos agora estão ajudando a desenvolver os incontáveis novos dispositivos tecnológicos na área de linguagem e línguas. Porém, tristes intérpretes ainda podem ser encontrados em feiras, onde, com um cartaz no pescoço anunciando as línguas com as quais trabalham, eles tentam vender suas habilidades por uma centena de dólares por dia. Têm sorte se conseguem cinquenta.
Com a economia brasileira indo muito bem, migrantes económicos da África e da Ásia entram pelas fronteiras porosas do Acre, da Amazônia e da Roraima, pressionando os serviços hospitalares, jurídicos e sociais. E poucos dos imigrantes falam Português. A interpretação remota tem sido a solução, e David Coles, o primeiro intérprete bilionário, e o primeiro para aparecer na capa da Forbes, comanda sua equipe do seu escritório de luxo na Berrini. Na tela resolve os múltiplos problemas das autoridades locais: nos postos de fronteira de Chui a Oiapoque; as consultas nos hospitais em Rio Branco; e os julgamentos no Tribunal de Justiça em Porto Velho. Os contratos de David com os governos federal e estadual são altamente lucrativos.

A pós-edição humana ainda existe, mas, mesmo em tradução literária Google e Baidu são cada vez mais bem-sucedidos. O vencedor do Prêmio Jabuti de Tradução de 2032 foi uma tradução automática pseudo-humana, ou seja, uma tradução automática que fingiu ser uma tradução humana, dos sonetos de Shakespeare para o Português. O escândalo com a descoberta de que uma máquina pode traduzir o bardo melhor do que o ser humano já diminuiu, e, como no xadrez, as máquinas agora competem regularmente com seres humanos para prémios de tradução. O favorito para o Prêmio Jabuti deste ano é uma tradução automatizada de Finnegans Wake de Joyce, realizada em menos de cinco segundos.
John Milton é professor de Literatura Inglesa e Estudos da Tradução na USP. Ele acaba de lançar Viagem à Turquia, Balcãs e Egito, pela Editora Hedra.

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